Adair Daufembach: “Música ainda é a minha vida e eu amo isso com todas as minhas forças”
Postado em 12/10/2018


Adair Daufembach um dos nomes mais importante quando se fala em produção ou mixagem da música Metal no mundo, segue firme com sua brilhante carreira nos Estados Unidos e com muito orgulho nós do site A Ilha do Metal, fomos convidados a conversar com Adair mesmo com sua disputada agenda e falamos de tudo, desde realizar o sonho de viver com música, de morar na mágica Los Angeles e trabalhar com os melhores e como tirar sempre seu máximo.

Com você a opinião do produtor Adair Daufembach sobre o trabalho da produção/mixagem musical.

A Ilha do Metal ‐) Oi Adair, bem vindo ao site A Ilha do Metal, hoje você uma referência na produção, mas como foi seu inicio de carreira, seus primeiros trabalhos e quando percebeu que realizava um trabalho diferenciado?

Adair Daufembach – ) Eu comecei gravando em Criciúma, Santa Catarina. Uma cidade que é um excelente celeiro de bandas. É incrível como uma cidade com 200 mil habitantes pode ter tantas bandas tão boas. Isso ajudou muito no meu início, porque o produtor é o cara que faz algo ficar melhor, mas se a música não é boa na fonte a gente não faz mágica (risos). Eu não tinha equipamento nenhum e compensava tudo com trabalho, a minha ideia era fazer com que a música e a performance das bandas fosse a melhor possível já que em termos técnicos eu tinha muitas limitações. Isso modelou a minha forma de produzir muito positivamente.

Eu reparei que o meu trabalho realmente tinha algo especial primeiramente quando bandas de todos os lugares de Santa Catarina começaram a ir para Criciúma gravar comigo. Num segundo momento, foi quando eu estava na Alemanha acompanhando a mixagem do primeiro disco que eu gravei com o Hangar, “Infallible”. Quem mixou aquele disco foi o Tommy Newton (Helloween, Ark e Gamma Ray) um cara super experiente, com um currículo incrível. Eu lembro bem que eu já estava preparado para levar vários puxões de orelha pela gravação que eu tinha feito (afinal, ele ia mixar um disco inteiro que eu havia gravado). Porém, num determinado momento da mix, nos primeiros dias, ele me falou: “você é muito talentoso, você fez um excelente trabalho”. Definitivamente a partir daquele dia eu comecei a acreditar mais em mim.

A Ilha do Metal ‐) Você usa muitos plugins, porém, principalmente no Rock, muitas referências das pessoas querem uma gravação quase que 100% analógica como se usasse apenas os gravadores de rolo, digamos, assim, então pergunto, como vê essa diferença das pessoas que presam mais para o tocar mesmo, e bandas novas com muita coisa adicional realizado após a gravação?

Adair Daufembach – ) Eu acho que isso depende do estilo da banda. Tem bandas que quanto mais moderno e perfeito você faz, mais feio fica. Enquanto outras, quantos mais old school e solto mais estranho vai ficando. É por isso que um produtor é tão importante no processo, principalmente um que entenda a filosofia da banda. Nem sempre a banda por si só sabe a melhora direção.

A Ilha do Metal ‐) Você é responsável por dois grandes álbuns que tenho ouvido muito, Project46, com o álbum Tr3s e o Maestrick com o maravilhoso Expresso Della Vitta Solare, e ambas bandas são de estilos bem diferentes, como é para um profissional atuar com estilos tão distintos e conseguir um resultado tão bom. Então a pergunta é Qual seu papel para transformar um talento bruto em um diamante?

Adair Daufembach – ) Cara fico feliz em falar disso. Esses são dois dos trabalhos mais especiais que eu já fiz. O Project46 é uma banda de um estilo mais moderno e eu aprendi a produzir e trabalhar com esse tipo de som ao longo dos anos, quando virei profissional. Enquanto que o Maestrick, é uma banda que remete as minhas raízes então eu só tive que visitar o meu passado para fazê-la (risos). Gostei tanto das músicas deles que eu literalmente (ó a cara de pau) me ofereci para gravar as guitarras do disco, já que a banda estava sem guitarrista. Gravei e sou muito orgulhoso do trabalho.

Isso é uma característica legal da minha forma de trabalhar. Como eu comecei tocando guitarra em bandas de vários estilos, Prog, Powermetal, Trash e até Fusion, eu tenho esse background mais técnico e old shool por causa dessa época. Quando me tornei profissional fui procurado por várias bandas de metal moderno super agressivas, estudei o estilo e passei a gostar também. Por causa disso hoje pra mim é fácil trabalhar com diferentes vertentes do metal.

É muito legal que as vezes eu também acabo inserindo elementos de um estilo no outro. Por exemplo no Fortress, que era uma banda com raízes mais melódicas, a gente colocou o Dijjy da Ponto Nulo fazendo umas partes meio rap e guturais, ficou sensacional. Também aconteceu com a Semblant que eu lembro de ter sugerido várias mudanças em vários riffs e partes para que o Álbum soasse mais “metal moderno”. No último disco do Project46, por exemplo, tem partes com muitos backing vocals em que eu fiz a harmonização toda deles, algo que veio lá dos tempos de metal melódico. É muito divertido, amo demais o que faço.

A Ilha do Metal ‐) Eu acredito muito na qualidade e determinação do brasileiro e você é mais um “case de sucesso” devido ao sucesso que chegou e para muitas bandas a nossa Geografia atrapalha muito, mesmo com o talento, e hoje você trabalha com pessoas e chama‐os de amigos ou clientes, pessoas que eram seus ídolos. Como foi para você o primeiro trabalho com um ídolo, qual foi seu desafio?

Adair Daufembach – ) O meu primeiro trabalho com um ídolo foi com o Aquiles Priester em 2008. Eu era muito fã do trabalho dele e eu lembro que a única coisa que eu pensava era controlar a ansiedade e não perder a oportunidade de mostrar o meu potencial por causa do nervosismo. Tinha que manter o foco e não cometer nenhum erro. Acredito que funcionou, pois trabalhamos até hoje (risos).

Com o Tony foi a mesma coisa, quando eu recebi os arquivos dele do EMGtv (meu primeiro trabalho com ele) eu estava transbordando de alegria. Eu lembro de eu apertando play e ouvindo a guitarra dele solada, eu comemorava dentro do estúdio como se eu tivesse feito um gol (risos). Porém isso é uma energia que é necessário conter. Eu não podia cometer erros novamente. Eu fiquei 4 dias fazendo a mixagem de uma música apenas. Quando eu mandei a música não teve praticamente nenhuma modificação na mix. Novamente, acredito que deu certo, pois também estou trabalhando com ele até hoje (risos).

A Ilha do Metal ‐) Vamos as perguntas de fofoca…..claro que numa escala menor, até nós como imprensa, muitas vezes se decepcionam com músicos ou artistas, naquilo de idealizar um profissional e conhecer apenas a obra e não a pessoa, você já teve surpresa com algum músico que encontrou dificuldades não esperadas, não pelo “ego”, mas pelo ser humano “ser difícil” e como foi superar esse convívio?

Adair Daufembach – ) É engraçado que isso é uma situação que existe, claro, mas eu me adapto. Acho que a principal função do produtor é justamente se moldar ao artista e, obviamente, à personalidade dele para conseguir fazer ele render. Tem músicos que nunca vão ter um bom desempenho em estúdio se você não falar firme com eles, enquanto outros precisam ter a sensação de controle e não podem ser afrontados, senão também vão perder o equilíbrio. Então, sim, há vários músicos assim, mas me adapto e sigo em frente.

A Ilha do Metal ‐) Na data de hoje, a música é descartável, e isso claro que veio pelos “famigerados downloads” ilegais, e com isso o ramo do entretenimento musical mudou todo seu conceito, e vejo com as voltas dos vinis, que continuam crescendo mas passou a febre de só edições especiais e mais caras, e voltamos ao normal, você acredita na volta da mídia física?

Adair Daufembach – ) Não acredito na volta da mídia física com a força que ele teve nas décadas de 70, 80 e 90, porque não acho que os jovens que aprenderam a ouvir música no celular teriam a paciência de ouvir música sentado na frente de um som ou ainda carregar um Diskman. O streaming é a nova forma que as pessoas ouvem música e se isso mudar não seria para a mídia física. Acho que o streaming é uma ideia ótima, só que ainda não funciona. Porque paga muito mal e ainda por cima não consegue ter lucro. Esse assunto me tira o sono e me irrita muito.

A Ilha do Metal ‐) Ai nos Estados Unidos, o que vê de diferente no mercado musical, comparado ao que tinha no Brasil? Eu penso muito na grana investida pela banda ou gravadora, que nada se faz sem marketing, como um produtor vê essa diferença?

Adair Daufembach – ) O mercado americano também está em crise, só que a diferença é que a Economia do País é muito melhor. O fato de ser tornado mais difícil ganhar dinheiro com música, para o americano não significa que eles precisam parar de fazer música, porque com qualquer emprego os membros de uma banda conseguem segurar as contas até que um dia a banda aconteça ou não. No Brasil isso é inviável, existe um limite, pois somente as pessoas que tem muita grana vindo de um outro negócio vão conseguir manter a banda mesmo que ela não ganhe dinheiro nenhum, ou seja, pouquíssimos. Já vi acontecer várias vezes essa situação de um membro de uma banda abandonar a música simplesmente porque não tinha como segurar as despesas da sua vida. Quando não se tem dinheiro para viver não há muito espaço para sonhos.

A Ilha do Metal ‐) E voltemos as fofocas…. que mudou no “gostar de música/banda” depois que passou a atuar profissionalmente com produção?

Adair Daufembach – ) Música ainda é a minha vida e eu amo isso com todas as minhas forças. O que mudou é como eu faço isso o dia inteiro eu não consigo terminar um dia de 10 horas de mixagem e chegar em casa e ligar um Slipknot para ouvir (risos). Tanto que eu já comprei várias brigas com a minha mulher por causa disso (risos). Ela adora ir em bar com música ao vivo e para mim é impensável ir para um lugar com música alta depois de 10 horas ouvindo música o dia inteiro (risos).

O que não mudou é o sentimento de ser abençoado por trabalhar com o que amo.

É uma situação difícil (risos). Algumas vezes quando é um show que eu quero ver muito eu vou mesmo que tenha gravado 12 horas. Ainda bem que esse tipo de coisa ainda não mudou. Isso aconteceu com um show do Satriani que eu fui em São Paulo em 2015, eu estava moído das gravações daquela semana e ainda assim eu fui e foi o melhor show da minha vida.

A Ilha do Metal ‐) Com a crise no Brasil muitos sonham em trabalhar fora, você sentiu algum preconceito, seja no ato do trabalho ou no viver ai em Los Angeles?

Adair Daufembach – ) O povo da Califórnia é super educado e gentil esse lugar é especial realmente, mas com a mudança do Obama para o Trump já começamos a sentir algumas farpas de alguns americanos quando saímos em restaurantes e lojas. Isso era algo que não acontecia nunca, mas hoje alguns deles quando percebem o sotaque de fora fecham a cara e atendem com muito mal humor.

A Ilha do Metal ‐) A pergunta de dar inveja, qual a melhor coisa e pior coisa de viver em Los Angeles, seja profissional ou pessoal… nos mate de inveja..

Adair Daufembach – ) A facilidade das coisas nos Estados Unidos é maravilhoso. Ter acesso as coisas que eu gosto, ter vários shows sempre acontecendo na cidade, poder comprar equipamentos que antes eram impensáveis são coisas incríveis. O problema, um pouco, é a comida (papo de gordo, risos). Depois de 3 anos aqui já acostumamos com a comida local e descobrimos vários lugares ótimos para comer, mas comida brasileira é a melhor do mundo. São Paulo com certeza é o melhor lugar do planeta para se comer.

A Ilha do Metal ‐) Muito obrigado, desculpe algo, mas o espaço é seu, sinta‐se a vontade para enviar uma mensagem aos brasileiros iniciando na carreira e que certamente curtiram todas suas dicas.

Adair Daufembach – ) Muito obrigado pela entrevista, adorei as perguntas e espero ter de alguma forma ajudado quem está começando na produção musical ou mesmo quem apenas aprecia música a entender como funcionam os bastidores. Muita gente sempre pede dicas sobre como se tornar um profissional do Áudio então gostaria de falar sobre isso. A coisa mais importante para se tornar um profissional do Áudio hoje é a prática e o convívio com bandas em estúdio. Nenhuma faculdade ou curso online vai te ensinar a lidar com os problemas de ordem pessoal e psicológica que ocorrem durante o processo de gravação. Um produtor tem que saber a parte técnica e também a parte humana da profissão. Quero muito espalhar essa ideia, obrigado pelo espaço.

Valeu galera!

Daufembach Studio
Los Angeles – CA

N da R: Agradecimento ao Vini Castellani (Project46) por todo meio de campo na entrevista

 

Categoria/Category: Entrevistas
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